Tese de Investimento da Alibaba (BABA)
Hoje vamos partilhar a tese de investimento sobre a empresa Alibaba (BABA) escrita por Albert Millan, investidor particular e autor do blog Enterprise Value publicada na primeira edição da revista Investir em Valor.
Se quer ler outras teses de investimento e entrevistas, pode descarregar o “Especial de Investimento na Ásia” da 1ª edição da revista Investir em Valor.
A Alibaba é uma empresa chinesa, fundada em 1999 por Jack Ma, com o objetivo de tirar partido do mundo emergente da Internet, para ajudar as pequenas empresas a expandir o seu mercado. Inicialmente, foi criada como comércio eletrónico B2B (business-to-business, ou seja, para transações entre empresas) com os domínios Alibaba.com e 1688.com e é atualmente a maior empresa de comércio eletrónico a nível mundial (medida por GMV, Gross Merchandise Value, vendido). Desde o início definiram o lema “Customers First, Employees Second, Shareholders third”, que marca a sua estratégia. O negócio da Alibaba concentra-se em fornecer a infraestrutura tecnológica e de marketing necessária para ter sucesso na era do comércio online, embora tenha um negócio altamente diversificado, com as seguintes linhas principais: core commerce, cloud computing, meios digitais, e innovation initiatives.
Descrição do Negócio
Core Commerce
Ao analisar a linha de comércio online, devemos distinguir o seu negócio na China do resto, bem como entre o retail e o wholesale.
A Tmall e Taobao operam na retail China. A principal diferença entre os dois é que o modelo da Taobao é C2C e o da Tmall é B2C. Ambas são responsáveis por 65% das receitas de 2020. Ambas são líderes nos seus segmentos, sendo a Taobao o maior site e-commerce da China, e a Tmall a terceira maior plataforma, a nível mundial, para marcas e retalhistas (a experiência é semelhante à de um centro comercial on-line, com páginas personalizadas para cada marca, o que melhora muito a experiência de compra). Incluem algumas características novas e muito bem-sucedidas, tais como live streaming para vendas (também alargada a outras filiais, como a Lazada), e, tendo em conta o seu sucesso, é muito provável que se mantenham também nas plataformas ocidentais. Rentabilizam a Tmall através de comissões e a Taobao através da sua plataforma Alimama, que utiliza a extensa informação disponível sobre clientes para melhorar a correspondência entre vendedores e compradores e permite o marketing P4P (pay-for-performance). Têm um programa de marketing de afiliados.
Para o cross-border retail, têm outras marcas. No Sudeste Asiático operam a Lazada, que terminou o ano (fiscal) com mais de 70 milhões de clientes únicos e, embora não tenham disponibilizado uma discriminação com númerosespecíficos, destacaram um crescimento de >100% YoY! Vale a pena recordar o forte crescimento económico verificado na região da ex-China da APAC e a grande oportunidade que ele representa para esta filial. Têm também a Aliexpress, que permite a clientes de todo o mundo comprar a produtores chineses, e a Tmall Global, que funciona ao contrário, para marcas e retalhistas fora da China. Estão presentes no e-commerce turco (que prevê ser a economia “europeia” de crescimento mais rápido nos próximos anos) através da Trendyol e no Paquistão e Bangladesh com a Daraz.
No wholesale, são líderes na China através do 1688.com, permitindo aos retalhistas um acesso fácil aos grandes grossistas e, para o resto do mundo, utilizam o domínio Alibaba.com, que completou transações com mais de 190 países em 2020.
Para além do e-commerce mais tradicional, estão a desenvolver novas iniciativas como o Freshippo, onde combinam o online e o offline. Neste caso, trata-se da sua própria cadeia alimentar, onde utilizam lojas de retail para fazer fulfilment das encomendas online, ao mesmo tempo que permitem compras onsite.
Sem serem diretamente commerce, têm também dois serviços muito relevantes e em crescimento, que estão intimamente relacionados com o seu negócio principal:
- Possuem 33% do Ant Group. Oferece um conjunto completo de pagamentos digitais e serviços financeiros através de partnerships (seguros, fundos de investimento…). É uma sinergia muito forte para pagamentos e crédito com o resto das linhas de negócio da empresa.
- Desde 2013, operam a Cainiao Network, uma plataforma de dados logísticos e uma rede global de fulfillment, com um forte enfoque na utilização de dados para melhorar a gestão logística. Têm também a Fengniao, especializada na entrega de alimentos e consumíveis. Nos últimos resultados trimestrais, os números da Cainiao mostraram um crescimento de 73% YoY.
Cloud Computing
O cloud computing é a tecnologia através da qual os serviços informáticos são oferecidos através de uma rede (geralmente a Internet). Embora relativamente jovem, conseguiu capturar praticamente todo o mercado (espera-se que processe 94% do workload total até 2021) e está a crescer a um ritmo altíssimo (CAGR projetado = 18% até 2023). Neste contexto de rápido crescimento, a Alibaba Cloud é o terceiro maior player a nível mundial e o maior na APAC. Oferece o conjunto completo de serviços na nuvem: BBDD, armazenamento, computação elástica, segurança, big data analytics, IoT, etc. Este ano cresceu muito acima do mercado (60% YoY) e já representa 10% das receitas totais da empresa.
A importância, rentabilidade e crescimento deste setor têm atraído muita concorrência (desde o início, em 2006, pela Amazon, através da AWS) e de grande calibre, como a Microsoft (Azure), Google Cloud, IBM, Tencent… de modo que as margens se reduzem, acrescido do facto de que os fossos defensivos são estreitos, por não existir um forte custo de mudança.
Meios Digitais e entretenimento
No mundo do streaming e do vídeo, a Alibaba tem a Youku, a terceira maior plataforma de long-form video da China. Complementa o core business, utilizando a informação do cliente para oferecer conteúdos relevantes e personalizados. Tem mais de 500 milhões de utilizadores mensais ativos e todos os dias reporta mais de 800 milhões de visualizações. Está a crescer muito, aproveitando, em parte, a proibição do YouTube e com o empurrão do boom do streaming, que beneficia, de forma colateral, do crescimento do setor dos videojogos e e-sports.
Innovation Initiatives
Para além das principais linhas de negócio, têm muitas outras iniciativas que complementam ou diversificam os seus serviços. Estas incluem a Amap, o maior fornecedor de navegação, cartografia digital e informação de tráfego em tempo real na China, a Fliggy como plataforma para viagens online, a ele.me, empresa líder no delivery local, a Koubei, que ofrece información personalizada sobre serviços locais (restaurantes, lojas…), e aporta muito valor para os comerciantes, permitindo um maior conhecimento do cliente.
Como vemos, contam com muitas linhas de negócio com fortíssimas sinergias entre elas, de modo que se cria um ecossistema que cobre a maior parte das áreas de serviços prestados a um cliente: consumo, pagamentos, envios, comida, entretenimento, etc. Além disso, a maioria delas operam em setores em expansão e com grandes perspetivas de futuro.
Análise da empresa
A Alibaba opera em setores com fortes ventos favoráveis: comércio online, cloud computing, streaming, delivery… e num mercado em expansão, pelo que tem um potencial único. Nos últimos 5 anos, multiplicaram os seus rendimentos 5 vezes (com uma média de CAGR de 38%), aumentando simultaneamente o seu GMV (Gross Merchandise Value) vendido por mais de 2 vezes. O crescimento dos números dos negócios ocorreu em todas as suas linhas de negócio, destacando-se os números do seu negócio core de e-commerce.
A sua margem operacional tem vindo a diminuir, à medida que incorporaram novas linhas de negócio, algumas das quais ainda não são rentáveis porque necessitam de massa crítica, passando de 28,8% em 2016 para 18% em 2020. Têm x50B$ em dinheiro, 50B$ em ações e investimentos e 47B $ na Goodwill como ativos mais relevantes (este é um negócio de asset-light, muito mais do que a Amazon, por intervir apenas como mercado, em geral). Tem dinheiro líquido. Embora, como é comum nestas empresas tecnológicas de crescimento rápido, exista um esquema de compensação em ações, estas cresceram a um ritmo relativamente lento de 1,5% por ano durante os últimos 6 anos.
Não precisam de um grande investimento em marketing para expandir a sua base de utilizadores, devido ao forte efeito de rede criado para os clientes (procura), e aos benefícios para as empresas (oferta) e especialmente as PYMEs, que obtêm acesso aos produtos de análise e gestão da Alibaba, que de outra forma estariam fora de alcance. A seu favor estão as economias de escala e o facto de se tratar de um negócio ligeiro em ativos, que não requer tanto pessoal como a Amazon, por exemplo, uma vez que a maior parte da sua atividade está em formato marketplace.
O efeito da COVID tem sido positivo para os negócios da empresa, uma vez que acelerou, ao longo de vários anos, a transição do mundo retail para o mundo online. Esta tendência, constante e imparável, deu um salto na adoção da Internet devido a restrições de mobilidade ou a precauções sanitárias instaladas em várias áreas. Além disso, este efeito é maior do que em alguns dos seus concorrentes ocidentais, uma vez que é combinado com a rápida recuperação económica em vários países nos quais opera. O efeito pode ser sentido em todas as suas linhas de negócio (todas têm uma tendência muito forte para o mundo online e digital). No segundo trimestre de 2020 (FY 2021 para a Alibaba, que termina o ano em março) apresentaram números espetaculares, com um aumento global de 30% nas receitas YoY, aproximando-se dos três dígitos em alguns segmentos, tais como o Cloud ou o Cainiao.
Valorização
A Alibaba, atualmente, capitaliza 750B$, tornando-a a sexta maior empresa do mundo, atrás da FAAMG e da Saudi ARAMCO, com um aumento de 38% no seu valor nos últimos 12 meses. Num mercado que valoriza o crescimento de forma muito generosa, os múltiplos surpreendentes em que o $BABA é negociado são bastante razoáveis (37x PER), especialmente quando já é rentável e comparado com outros peers. Devido a semelhanças comerciais (negócio retail, cloud, mercearias, media) e embora tenham algumas diferenças claras (Alibaba como marketplace e Amazon como intermediário /retailer online, negócio grossista, novas iniciativas …) e um TAM muito superior (para acesso e penetração na APAC), a sua comparação mais direta é a Amazon (capitaliza pouco mais de 2 vezes, com um múltiplo de valorização de 2,5 vezes) e, de forma mais parcial, outras como a MercadoLibre (esta, muito mais pequena, 0,1 vezes, mas sem lucro, por enquanto). As chaves para a comparação são:
- A Alibaba tem um crescimento mais elevado (nos últimos 5 anos, multiplicou a sua receita por 5, enquanto que a Amazon a multiplicou por 3).
- A Alibaba apresenta margens operacionais mais elevadas (18% vs 5%).
- Vantagem na diversificação de negócios e com um mercado em expansão (APAC + China) para a Alibaba.
- Melhores métricas de retorno sobre capital para a empresa China.
- Negócios muito mais leves em ativos e especialmente em pessoal.
- Ambas enfrentam, como principal risco, a ameaça regulamentar/política, embora no caso da Alibaba este risco seja maior, devido às particularidades políticas do seu principal mercado, a China.
Com estas premissas e assumindo que se mantém o múltiplo de avaliação, as margens EBITDA estáveis (~25%) e um crescimento um pouco inferior (30% projetado vs 38% observado), teríamos a seguinte evolução (assumindo um crescimento anual de 1,5% no número de ações):
Se, além disso, adicionarmos variações múltiplas, o valor final teria de ser ajustado. Devido ao crescimento, diversificação e ventos favoráveis, não seria surpresa se, a médio prazo, se tornasse a empresa líder em termos de capitalização de mercado a nível mundial.
Existem alguns catalisadores para a cotação, tais como a IPO da ANT, que, embora ligeiramente dificultada pela sombra do risco político, presumivelmente após as declarações críticas de Jack Ma contra o governo chinês, tem um enorme potencial e faz sobressair o valor para a Alibaba ao ir a público de forma independente. Por outro lado, o horizonte da guerra comercial com os USA desvanece-se após a vitória de Joe Biden que, embora eu acredite que não poderia ter um efeito material a longo prazo, lançou uma sombra sobre a cotação. Em resumo, a Alibaba tem vários fatores que a tornam atrativa como ideia de investimento:
- Grande valor de marca e é líder mundial no seu negócio.
- Um fosso defensivo gigantesco.
- Crescimento rápido e valorização atrativa (em relação aos peers).
- Ecossistema completo com fortes sinergias entre áreas.
- Vento favorável no e-commerce e na região em que opera.
- Digitalização total, integrada na cultura.
E, por outro lado, embora quase único, apresenta um risco muito relevante no campo político/regulamentar.
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